quinta-feira, 14 de março de 2013

TRAQUINAGENS

Era menina numa cidadezinha do interior e brincava de amarelinha pelas capristanas das ruas.
Cabelos amarelos contrastando com os olhos verdes e chamada pelo Gil da loja, de Martinha. Não sei porque ele via em mim traços da miss eterna, Marta Rocha.
Fui feliz. O grupo Escolar "Silveira Drummond" era minha alegria: contava os minutos para as aulas começarem.
Além de bom estudo, brincadeiras sem malícias e os cantos dirigidos por D. Finoca: "Desperta no bosque, gentil primavera"...
E a primavera chegava com o canto do gentil sabiá...
Fui uma menina tímida, mas não perdia a chance de fazer uma traquinagem... em casa o coro comia.
Tive uma mãe muito rigorosa!
Muito amiga de Rosangela Cruz, quantas vezes fui pra sua casa, na garupa do cavalo, para dormir e voltar no dia seguinte cavalgando meus sonhos pelo São José... As aulas eram mais doces e a felicidade brilhava em meus olhos de menina!
Lulude era minha colega de carteira: meninas de um lado e meninos do outro.
Raramente conversava com um menino... minha mãe prevenia tanto e eu tinha medo. Mesmo assim, Arthur Elisio foi padrinho de uma boneca que me pertenceu. Segundo ele, vestiu terno pela primeira vez.
Mas quem me encantava era outro garoto: menina levada, mantinha o caderno de "perguntas indiscretas", que corria de mão em mão...
O objetivo do caderno era conhecer os possíveis segredos de cada colega e, quem sabe, alguma dica que sugerisse um namorico.Que delícia... O caderno rodava  pelas mãos de todas as meninas, o que matava de curiosidade a vida dos meninos.Todas as meninas tinham o seu...
Escrevínhamos com caneta tinteiro e as carteiras possuiam um círculo para acondicionar o tinteiro.
Um dia, na hora do recreio, o menino que preenchia meu coração de doçuras inimagináveis,disse:
- Júlia, você consegue colocar a caneta, assim, em pé? E segurou a caneta de ponta pra baixo.
Disse: _ Claro que consigo... E na minha ingenuidade, segurei a caneta com a pena pra baixo, mas a segurando pela tampa. Claro que a caneta caiu e sua pena entortou-se toda...
Ele riu um riso safado, com certeza da minha infantilidade.
Passei aperto: como mostrar em casa? Seriam outras varadas?
Minha reação foi fazer-lhe careta e "ficar de mal". Como doeu meu coração...
Contei ao meu pai. Ele, com sua doçura, consolou-me e pediu que não me preocupasse.
Neste dia, fiz meus deveres a lapis.
Não sei dizer quem consertou minha caneta. Só sei que a tenho até hoje.
Sou uma mulher madura. Os olhos continuam verdes.
O menino? Nunca mais vi.
Mas transformou-se num homem bonito, que dia desses, o verei de perto.
Será se me lembrarei das "perguntas indiscretas"?
Na realidade, aguardo pelo sorriso lindo e, buscarei no seu rosto os traços da criança matreira , que já demonstrava desejos para os primeiros namoricos.
Quero ser a mulher de hoje e, quem sabe, realizar um sonho  do Caderno que reservava as fantasias
de uma menina moça?
Credo! Não se fala mais assim... Onde você se escondeu, alma sapeca?
Seja mulher do século XXI, acalentada pelos sonhos de uma menina...

 

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